A narrativa se desenvolve de forma não linear, alternando habilmente entre diferentes linhas temporais e perspectivas de personagens. De início, acompanhamos acontecimentos aparentemente desconexos: uma criança com um desenho perturbador, dois amigos investigando um blog obscuro e um repórter em busca da verdade sobre um crime. A genialidade da história está em como Uketsu entrelaça esses fios, fazendo com que cada recorte temporal adicione uma camada de significado ao todo, criando um quebra-cabeça que o leitor se vê compelido a montar.
O coração sombrio da trama pulsa na figura de uma antagonista construída com complexidade e nuance. Longe de ser um vilão unidimensional, ela provoca reflexões perturbadoras sobre os limites da proteção e a natureza do mal. A premissa de que “imagens”, seja um desenho infantil ou um registro digital, podem conter pistas codificadas para desvendar crimes funciona como o elo que conecta passado e presente, revelando uma teia de segredos familiares e atos brutais que se arrastam por anos.
Outro ponto que às vezes me soou forçado é a relutância constante dos personagens em acionar as autoridades legais, especialmente diante de situações que claramente ultrapassam o papel de um civil. Mas entendi que essa escolha narrativa, apesar de inicialmente estranha, se torna um pilar essencial para a atmosfera do livro. Ela reforça o senso de paranoia e a ideia de que os personagens precisam depender apenas do próprio intelecto e instinto, mergulhando o leitor em um universo onde a justiça formal parece distante ou ineficaz. O que começou como um “ah, tá… sem essa” acabou se transformando em um “meu Deus… show!” no final.
Apesar dessas considerações pontuais, a experiência de leitura é inegavelmente fluida e cativante. A prosa de Uketsu é acessível e envolvente, com um ritmo quase ci-ne-ma-to-grá-fi-co que faz virar páginas se tornar um gesto involuntário. A diagramação bem cuidada e a capa lindíssima e significativa complementam a imersão, mostrando que a edição física recebeu o mesmo cuidado que a trama.
Em suma, Imagens Estranhas é uma leitura compulsiva e gratificante para fãs de thrillers psicológicos bem arquitetados. A habilidade do autor em amarrar tantas linhas narrativas em um final coeso e impactante é louvável. Os momentos que desafiam a credibilidade acabam ofuscados pela força da narrativa e pela profundidade do conflito central. A obra não só entretém como deixa aquele selo de que nosso tempo foi bem gasto. Consolidando ,em minha opinião, Uketsu como uma voz muito original e ousada na literatura de suspense.
Até a próxima,
Elôh Santos
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